Sem bloco na rua!



 Quando eu era criança, estávamos na época das fitas (que nelas tocavam músicas); e pra quem não sabe ou não lembra, quando a fita acabava, a gente enfiava uma caneta na parte do meio, e rebobinava a fita, pra tocar do início.

E eu que sempre gostei das palavras e do que elas significavam, achava incrível a palavra rebobinar. Porque na época eu entendia que “ré” significava voltar ao início. Então toda vez que eu queria dizer que sentia falta de algo de antes, ou que precisava fazer de novo alguma coisa, colocava o “ré” antes da palavra. E assim, criei pra mim, palavras que nem mesmo existiam na gramática, como: rereunir, rebeber, redançar, reobservar, reandardebicicleta, rebrigar etc.

Bom, cresci gostando de criar palavras. 

E essa foi a forma que eu consegui de reexpressar algumas sensações. 

Vou contar em 3 partes…

O ano era 2004, eu tinha 10 anos!

Com meus pais recém separados, minha mãe viu em outra pessoa, a oportunidade de fazer coisas que a muito tempo não fazia; reviver o carnaval.

E aí eu conheci essa festa, com bebidas, paredões, mela-mela, casas aleatórias com 40 pessoas mais aleatórias ainda dentro. Dormindo uns 12 em cada quarto e quatro dias seguidos sem sobriedade.

O que eu fazia? Bom, eu apenas esperava passar. Contando e recontando cada segundo que faltava.

O tempo passou novamente, e

O ano era 2014, eu tinha 20 anos!

Com minha mãe recém solteira, eu na faculdade, vi nas novas programações e amigos, uma oportunidade de experimentar o que era o meu maior horror; rereviver o carnaval.

E aí eu reconheci essa festa, com fantasias, máscaras, marchinhas, bandas, pessoas de toda idade; festejos no ônibus, no metrô, nos terminais, na rua, nos blocos. Pessoas coloridas, cheias de gliter, dançando passos descoordenados e com um sorriso de orelha a orelha.

O que eu fiz? Bom, eu me apaixonei perdidamente pelo carnaval. Contando e recontando cada segundo do resto do ano pra poder começar de novo.

E cá estamos nós,

O ano é 2024, eu tenho 29 anos…

A fantasia não foi eterna!

O que aconteceu? Nada!

O que eu fiz? Nada!

As cores não estavam me cabendo, literalmente. Só iam até o número 40 ou tamanho M. Não tinha coragem de sair na rua, ver pessoas. Ser vista por elas. Aquelas músicas me tocavam por dentro, mas meu corpo não respondia por fora.

Era como se por dentro eu tivesse gritando com toda força e por fora estava como uma lady aposentada que nada mais desejava.

Cantava as músicas na minha cabeça sem ao menos abrir a boca.

É como se eu tivesse engolido o carnaval!

A sensação era de está totalmente reprogredida. Só que dessa vez, não era um ré pra começar de novo, era um ré de retroceder.

E aí eu tive um sonho, simples, curto e perfeito.

Eu estava em frente a um espelho, meio cinza; olhava para meu reflexo e questionava: “será que em uma das minhas compulsões, eu comi a morte e matei o carnaval?”.



Carnaval de 2020

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