Aquela forma que a gravidade cai.


Sua voz é fraca e penosamente lenta. Há um grande intervalo entre cada som que ele pronuncia. Suas roupas estão mal cuidadas, largas, desleixadas, até sujas. Falta-lhe um botão na camisa e existe um abotoado no lugar errado. Seus ombros curvados para frente tentam esconder o rosto fino. A barba grisalha está por fazer. A face é de tristeza, pálida, com grandes sulcos laterais. Duas olheiras sustentam um olhar sem expressão. Os cabelos, também grisalhos, mal penteados, mal cuidados e grandes para a sua pequena testa. Os óculos têm um dos vidros partidos e um das hastes amarradas com uma linha que um dia foi branca. Nas pontas dos dedos finos, unhas grandes, sujas e amareladas pelos cigarros constantemente acesos. Apesar do calor, nota-se, por baixo de sua camisa, uma camiseta de malha e, por cima daquela, um paletó roto e largo. Seus dentes talvez há muito não sejam escovados e no bigode ralo acha-se o que restou da última refeição. Pouco fala e, quando o faz, parece aborrecido e cansado de estar ali, defronte a mim, para relatar suas misérias. Às vezes seus olhos se umedecem, lágrimas lentamente começam a escorrer, mas ele discretamente passa o punho do paletó sobre os olhos e os enxuga, engolindo, através de sua garganta seca, alguma lágrima que desceu. Tudo é vagaroso e penoso. O paciente transmite dor e solidão. Seu desespero, tão profundo quanto sua amargura e tristeza, contamina a minha mente, também às vezes triste e confusa por conviver, há anos, dia-a-dia, com o absurdo e incompreensível sofrimento humano.
[...]
Para o deprimido, o mundo é mau, e ele, não tendo meios para enfrentá-lo, acha-se sem saída. Com essa convicção, surgem frequentemente as ideias ou a ação de suicidar-se. A obsessão é escapar do sofrimento, ainda que seja necessário sacrificar a própria vida. Podem surgir na mente do deprimido fantasias que o levam a querer exterminar toda a família, para livrá-la do mundo de desgraças em que vive. Também não é incomum o suicídio indireto, causado pela provocação da própria morte por outra pessoa ou por um acidente fatal. Nessa fase é ainda frequente o uso exagerado de bebidas ou calmantes que têm a mesma função, isto é, tornar as próprias desgraças e as de seu mundo mais toleráveis.
O deprimido é, portanto, uma pessoa que perdeu a capacidade de manter uma adaptação biopsicossocial equilibrada dentro da normalidade, ao enfrentar os múltiplos fatores ou mini acontecimentos de seu cotidiano (fracassos, perdas, doenças, desapontamentos, etc.). Seu sistema individual não retorna ao equilíbrio anterior, com a consequente normalização, após cada problema.
A depressão é um transtorno emocional ou do afeto, como o próprio nome indica, mas que pode ter repercussões graves e sérias no relacionamento social, acarretando perturbações cognitivas, psicomotoras, psicofisiológicas e ainda facilita a instalação da maioria, senão de todas as doenças orgânicas, pela diminuição das defesas imunitárias.
A esta altura, convém lembrar que algumas depressões parecem originar-se primariamente de distúrbios bioquímicos, enquanto em outras as causas iniciais são transtornos psicológicos e sociais, ocorrendo, posteriormente, as modificações bioquímicas.
Uma vez mergulhado na depressão, o paciente não crê que possa escapar dela.

A Triste História dos Deprimidos

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