Piloto automático


É assustador a maneira ridicularizada que nossas reações estão sendo codificadas. Temos uma constância de eventos trágicos acontecendo no Estado, no pais e no mundo inteiro, e repetimos em coro “mas que triste, é uma pena”. 
Diminuir o valor das coisas tem sido cada vez mais óbvio, prático. 
Se a seca no Nordeste deixa vários sem ter o que comer e beber, é uma pena. 
Se um a pessoa entra numa escola e mata vários alunos, é uma pena. 
Se um marido esfaqueia a esposa, é uma pena. 
Se ninguém dá nenhuma notícia triste, continuamos dizendo que é uma pena, porque é piloto automático.
Chegar num consultório terapêutico com três diagnósticos feitos por você mesmo, é de fato, uma pena. 
Entregar o celular para seu filho parar de lhe chamar para brincar, é uma pena. 
Plagiar a ideia de alguém, não ser descoberto e se sentir orgulhoso, é uma pena. 
Olhar para o rosto da sua esposa todos os dias e não dizer que ela é linda... É uma pena.
Estamos tendenciosos a virar “bosta”, como diria outra gênia, Rita Lee, numa velocidade sem tamanho. A desesperança vem atuando e vestindo sua melhor roupa, e sendo aplaudida de pé como uma dama escura da noite que tudo que tem, é de fato o que merece. 
Estamos falando de consequências, efeitos, reações. Passamos por cima das causas, estímulos, por nada.
A quantidade de pessoas que chegam em terapia dizendo palavras soltas como: não sei, não entendo, não vejo, não sinto nada. Como é a vida sem sentir nada? Sem ver nada? Para onde foram nossos olhos que não se encontram mais com olhos reais? O que aconteceu com nossos dedos que só tocam tecla e tela? Como queremos sentir nada? 
Isso já é o nada esperando mais uma pena.

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